Odeio o Dia dos Namorados

Chegaram ao destino. Sacolas na mão, sushi e bebidas. Um clima diferente, estranho para a data. Ele não imaginaria o que estava por vir.

A data, o décimo segundo dia do sexto mês de algum ano. Como antes já foi dito: "Datas, elas são importantes". E essa era especial, não só pela fama dos apaixonados, não só pelas filas de carros nos motéis...


Há de voltar um pouco na história pra entender como tudo aconteceu...


"Bem, há um ano, em uma semana, todo o pouco que se teria tentado construir até ali seria destruído. Não por um, confesso. Mas por dois. Ou até mais de dois, se me permito dizer... Depois dos melhores presentes e molhadas lágrimas, supostas de alegria e emoção, tudo se dissolveria para sempre, mesmo que saibamos que o "pra sempre" sempre acaba. E mesmo que os dois continuassem tropeçando e sofrendo pelo caminho que ambos sabiam ser o final implacável. Haveria outro caminho?"


Mas hoje, hoje tudo parecia tão distante e superado! Como num belo filme de amor naquele típico final, antes, é claro, dos créditos subirem e sairmos da sala de cinema, sem saber que a garota vai dizer que não conseguiu perdoar e largar o cara pra sempre.


Comeram, beberam e riram, falando de amenidades, trocando carinhos... As velas exalavam o cheiro de cera e fogo. Era uma noite quente. E ela, como sempre, já havia se acostumado a tentar ao máximo postergar os momentos ruins. Era o que fazia àquela altura... Na verdade, já estava prestes a desistir de todo o "plano". Ninguém merecia tal dia dos namorados, e essa era uma constatação fácil de se fazer.


Havia muito a ser dito, embora um ano tivesse se passado e juntos permaneceram durante boa parte desse tempo. Mas fisicamente.

"-Sempre ótimo na cama", pensava consigo mesma. Ou pelo menos assim imaginava, depois de poucos e tão diferentes e quadrados parceiros.


Sempre houve um "quê" de loucura nos dois. E a empolgação veio antes da química, e a química veio antes da física. E a física antes da matemática errada. E a matemática errada antes da biologia. E a biologia diz que tudo que nasce, morre. Incrível como sempre chegavam a esse ponto insistente. A morte, o fim de alguma coisa... E os dois tinham medo, pois apenas se falava naquilo. Nunca tiveram exatamente a coragem de fazê-lo...


Havia um "quê" de muita coisa. O que não era realmente bom, pois era e sempre seria apenas um "quê", sem outra e qualquer letra do alfabeto com mais curvas e menos cortadas de pernas...


O fato é "quê", ele não chegaria nunca a imaginar o que aconteceria naquela noite. E antes que o leitor se prepare emocionalmente, frustrando-se em seguida, peço que não espere por reviravoltas, ou um fim estonteante. Na verdade nem era um fim... Como dito antes, ambos tinham medo desse maldito.


Não foi o fim de mentiras. Essas já não existiam há tempos entre os dois. Não foi o fim da amizade e do carinho. Não foi o fim do sentimento, era tudo muito real e palpável, mesmo que limitado por tudo que houve entre os dois... Não foi o fim dos dois, tampouco. Continuariam juntos, mesmo que fisicamente... Afinal, "tão bom de cama ele era...". E isso ela continuava repetindo, como num mantra a distraí-la de todo o resto e adiar aquilo que ela havia prometido a si mesma fazer, mas que agora já não fazia o menor sentido... Não era o fim da vida. Não era o fim do mundo. Não era o fim da tristeza nem o fim da alegria.


O único fim que haveria era o fim daquela noite. Onze horas e nada ainda havia sido dito. E claro, ele nunca imaginava que o mundo rodava a 1.675 km/h, e a cabeça dela mais rápido, tentando pensar em tudo... Organizar tudo, tão treinado antes, mas agora apenas um borrão de ideias que pareciam bem erradas...


Nunca parecia certo qualquer instante de DR entre os dois. Nunca pareceu natural, prático e muito menos funcional...
- E não seria também agora - pensava ela consigo, como quem arruma o desculpa covarde pra fugir do que quer muito fazer, ou do que é necessário.
O esforço dele era visível. Para manter tudo no lugar. Para agradecer na medida certa. Para sorrir feliz. E que sorriso...
Ela sorriu de volta. Um outro dia havia começado. O relógio marcava Zero horas. Poderia aguentar mais um dia... Aproximou-se, e com um beijo, fechou a noite mais ou menos romântica de sua vida. Nunca saberia dizer.
- Depois eu falo - pensou consigo mesma - Depois... - E com uma afetação maior no pensamento - Odeio o Dia dos Namorados...

E silêncio.